O Círculo da Palavra “POVOS ORIGINÁRIOS”
Éramos aproximadamente 10 ou 15 pessoas. A reunião seguia um roteiro ritualístico: colocava-se um pau-santo (tipo de incenso) a queimar no centro da mesa ou da roda onde estávamos todos sentados ao redor; os presentes serviam-se de uma das folhas de coca colocadas num recipiente deixado sobre a mesa ou no meio da roda, em cima de uma toalha; e, um dos participantes mais experientes, pedia licença e iluminação às Montanhas (quando estávamos em Mendoza), aos Rios (em Entre Rios), e ao Vento.
Em Entre-Rios, nos reunimos num espaço aberto, foi acesa um fogueira, demos as mãos e formamos uma roda muito grande que ia caminhando e girando. (Manoel, do Equador, se tornou o acendedor de fogueiras).
Após o ritual de abertura, eram iniciadas as falas.
Muitas das falas relatavam morte e agressões sofridas por lideranças indígenas. Outras denunciavam a invisibilidade destes povos, como se não fossem vistos, não existissem. e quando apareciam, eram considerados vadios, preguiçosos, sujos, inoportunos ocupantes de terras cobiçadas pelos interesses de produção, consumo e mercado.
O Circulo de la Palabra “Pueblos Originarios” foi coordenado por Cláudia Herrera, Gustavo Vitale e Ruthy Loza.
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Segundo a sistematização publicada no site Iber Cultura Viva, ficou acordado que o Movimento Cultura Viva Comunitária
1 – denunciará a apropriação de territórios ocupados por povos originários;
2 – deixará uma Whipala e/ou uma Chakana nos países onde o Congresso for realizado;
3 – resgatará a história das nações, dos países e da sua relação com o os Povos Originários dos países onde o Congresso for realizado;
4 – promoverá financiamentos para garantir a participação de indígenas, pelo menos do país onde o Congresso for realizado;
5 – iniciará cada congresso e caravana de Cultura Viva Comunitária pedindo permissão aos ancestrais daquele lugar. Considerará que cada evento pode ter um ritual diferente, porém, sempre que possível, realizá-lo em lugares significativos das lutas dos povos originários.
6 – deverá constar explicitamente da Lei Cultura Viva Comunitária, as reivindicações dos povos originários; e,
7 – que indígenas participem das equipes de organização antes, durante e depois dos Congressos. E que nas cerimônias de abertura, ao lado dos representantes do ibercultura, do governos e da organização do CVC, estejam presentes representantes dos povos originários.
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Estratégias
1 – Incluir no Movimento Cultura Viva Comunitária, o resgate da cartografia dos povos originários e seus saberes ancestrais.
2 – Fomentar o respeito à Mãe Terra e, consequentemente, o sentimento de que somos todos irmãos (filhos da mesma mãe)
3 – Resgatar vozes que se encontram marginalizadas pela homogenização e imposição de outras línguas.
4 – Através da identificação e integração com os povos originários, buscar a descolonização dos nossos valores, costumes e cultura.
5 – O círculo da palavra “Povos Originários” é um tema transversal aos outros círculos: deve dialogar com os demais mas manter-se independente para trabalhar a cura.
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Propostas:
1 – Prosseguir com a resistência. Fazer uma declaração dedicada aos povos originários que resistem não só como solidariedade mas para dar visibilidade ao seu sofrimento.
2 – Incluir os conhecimentos ancestrais no currículo escolar do ensino fundamental ao universitário, incluindo ações deste movimento. Incluir metodologias e educação intercultural na docência formal.
3 – Descentralizar os projetos de Cultura Viva Comunitária que costuma acontecer mais no contexto urbanos do que nos territórios dos povos originários.
4 – Criar espaços nos congressos de Cultura Viva Comunitária para o intercâmbio de sementes sagradas, criolas e nativas, fortalecendo o cuidado com as mesmas.
5 – Deixar uma Wiphala e uma Chakana nos lugares onde se realizam os congressos. Dar visibilidade ao trabalho dos povos originários realizados nos locais visitados durante o congresso.
6 – Impulsionar programas sobre práticas dos povos originários.
7 – Incluir no congresso os sábios anciões ancestrais.
8 – Preservar e recuperar territórios das cerimônias ancestrais.
9 – Preservar os caminhos ancestrais como el Qapaq Ñan (Caminho da Terra)
10 – Multiculturalizar sem folclorizar as culturas. Romper as barreiras que nos impedem a interculturalidade.
11 – Trabalhar em sincronia com os tempos da Terra. Alcançar a libertação do ser-humano e da Mãe Terra.
12 – Nos discursos do movimento Cultura Viva Comunitária, além de falar do território Latino-americano, América Central e Caribe, falar também do território de Abya Yala.
13 – Construir o Bem Viver de mãos dadas com os povos originários.
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Tensões:
1 – Os povos originários no contexto latino-americano atual, continuam sendo invisibilizados, marginalizados , expulsos de suas terras e até assassinados de maneira impune. Esta é uma realidade lamentável, generalizada em diferentes países, que devemos denunciar. Vemos como, de forma recorrente, se negam os direitos às comunidades indígenas. O pensamento colonial continua presente na sociedade, governos e até nas próprias comunidades onde a identidade dos povos originários está vulnerável.
2 – Existem processos que sistematicamente oprimem os povos originários e podem chegar a impôr condições de escravidão moderna nas relações de trabalho, sexuais e outras.
3 – Os processos educativos e religiosos continuam sendo sistemas que negam as tradições e cosmovisões dos povos originários. Embora existam correntes que respeitam as culturas e o diálogo interreligioso, existem outras como a corrente indígena de Opus Dei (igreja católica) e as Testemunhas de Jeová (protestante) que pretendem erradicar o exercício das espiritualidades indígenas, impossibilitando o diálogo e o encontro real das comunidades.
4 – Os conhecimentos ancestrais não são valorizados no currículo do sistema educativo formal.
5 – Existe o problema da água e do uso de produtos químicos que levam à morte principalmente os povos indígenas.
6 – Os povos originários, mesmo que falem o castelhano, ainda pensam na sua forma cultural. Quer dizer, se são Quechuas, pensam em quechua; se são Guaranis, pensam em guarani; se são Chorotegas, pensam como chorotegas; se são Huarpes, pensam como huarpe, etc
7 – A descriminação e o racismo ainda estão presentes em nossos contextos: os povos originários continuam lutando e resistindo às investidas a que são submetidos. Nossa luta é necessária em termos mundiais. É tempo do Pachakutik e do Inkarri. Lutamos há 500 anos e continuamos mais vivos do que nunca.